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Casal expõe violência e gera onda de relatos semelhantes nas redes

Midia News

Tortura, medo, indignação e nojo. Esses são alguns dos sentimentos descritos por quem se inteira de relatos de mulheres vítimas de violência durante o parto. O tão esperado momento, sonhado por muitas, se torna uma sequência de episódios traumáticos dignos de um filme de terror.

De deboches como “na hora de fazer foi bom”, “fica calada, se não atrapalha”, as agressões resultam em olhos sangrando de tanto fazer força, clavícula do bebê deslocada, desmaios, mutilações e até a morte, tanto da mãe quanto do bebê.

Essas tristes realidade foram relatadas em uma publicação do Facebook de Ronaldo Francisco, que usou o espaço para demonstrar sua indignação com o tratamento recebido pela esposa, a mãe de primeira viagem Valéria de Melo, no Hospital Regional de Sorriso.

Ela saiu com os olhos “puro sangue” depois das veias estourarem de tanta força que fez para ganhar o bebê.

A publicação teve mais de 2 mil comentários e 1,9 mil compartilhamentos.

Em entrevista ao MidiaNews, Ronaldo contou que quase perdeu o filho pela falta de profissionalismo da equipe e, apesar de ser difícil, decidiu “gritar” ao mundo o seu drama. Pelo descaso no atendimento o menino nasceu roxo e com os batimentos cardíacos fracos.

“O trem foi bem complicado, e a gente demorou em tomar a decisão de denunciar, de falar pro povo o que estava acontecendo”.

O drama da família durou 5 dias, desde que Valéria deu entrada pela primeira vez na unidade, no dia 1 de junho. Ela recebeu alta no dia seguinte já com dores e início de dilatação.

Não suportando mais as contrações, a jovem deu novamente entrada no Hospital por volta das 19h, do dia 4. Cerca de uma hora depois foi novamente liberada pela equipe.

Nesse mesmo dia, por volta das 23h, Valéria precisou ser novamente internada e passou por momentos de terror com violências de toda ordem: físicas, verbais e psicológicas.

Essas violências aconteceram desde a internação, quando foi impedida de permanecer na companhia da mãe, direito esse garantido por lei. “Eles a deixaram realmente à sorte, houve deboche da parte de enfermeiras, da parte dos médicos. Total descaso”.

Ronaldo conta que uma das enfermeiras chegou a dizer: “Fique quieta, pois quando estava fazendo tava bom, né!”.

No dia seguinte, por volta das 5h, outra enfermeira resolveu conferir os batimentos cardíacos da criança, que já estavam fracos.  “Foi o senhor meu Deus que a enviou”, afirmou.

Mais que de pressa, Valéria foi levada para a sala de parto, onde mais uma vez foi violentada pelos profissionais. “Lá a forçaram, cortaram as partes íntimas dela, em vez de fazer a cesárea”.

“Ela não tinha dilatação, o nenê estava com dificuldade de vir ao mundo e eles machucaram muito ela. De tanto fazer força estourou veias no corpo todo, o olho ficou puro sangue”, lamentou.

Apesar de toda a violência, mãe e bebê passam bem e a família tenta superar o ocorrido. “Graças a Deus o meu filho está bem, minha esposa também. Isso é o que mais importa pra mim”.

A ponta do Ice Berg

A publicação que estampava os “olhos puro sangue” de Valéria, comoveram não só pela empatia, mas pela própria vivência de mulheres e seus familiares. O caso da jovem é apenas a ponta do Ice Berg, e revela nuances perversas da saúde pública no País.

Segundo o professor Neudson Johnson Martinho, professor do Curso de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso, em Cuiabá, a violência obstétrica é uma realidade dentro das unidades de saúdes, principalmente as públicas.

No Estado, segundo o profissional, existe ainda uma especificidade – a subnotificação dos casos. “As mulheres não denunciam, porque nem elas, nem as famílias têm noção do que seja uma violência obstétrica”.

Martinho explica que a violência obstétrica se apresenta em três níveis, a psicológica, a física e a emocional.

A psicológica se caracteriza pelas falas ofensivas e depreciativas com a paciente, como foi no caso de Valéria: “Na hora de fazer foi bom”.

A física é aquela visível aos olhos como o sangramento das vias óticas da jovem, a episiotomia -o famoso “pique”, que consiste em uma incisão cirúrgica para auxiliar o parto.

Segundo Martinho, no País aproximadamente 56% das mulheres são submetias desnecessariamente a episiotomia. A recomendação da Organização Mundial da Saúde é de que apenas entre 10 a 30% sejam submetidas ao procedimento.

Já um exemplo de violência emocional é negar à mulher a permanência de um acompanhante durante os procedimentos.

“Há relatos e relatos, principalmente com mulheres pobres e negras, e mulheres que tem um trabalho de parto mais demorado, de até 16 horas, ou quando é a primeira gestação”.

Martinho explica que em casos de violência obstétrica as vítimas podem entrar com uma ação no Ministério Público.

Experiência de quase morte

Dentre as centenas de relatos compartilhados na publicação de Ronaldo muitos se assimilavam ao de Valéria, veias estouradas, deboche dos profissionais, descaso, agressões. Uma experiência de quase morte que por pouco não culminou em uma.

Identificada pelas iniciais M.S., uma mulher relatou que os médicos e enfermeiros tentaram a todo custo induzir o parto dela e a criança nasceu desacordada.

“Eles forçam demais, induziram e eu perdendo liquido durantes dois dias. […] Meu bebê nasceu desacordado e roxo, quase fico sem meu filho”.

O caso de C.R., aconteceu há 17 anos e mostra como no cenário nada mudou. “Quando fui ter minha filha nesse hospital, por um erro de uma médica, hoje minha única filha carrega sequelas neurológicas pro resto da vida”.

A filha de M.B, de 8 anos, também carrega sequelas do parto traumático devido a uma clavícula deslocada – as costas apresenta uma pequena diferença.

M.B. conta que ficou em trabalho de parto por 24h com “dores horríveis e sem poder gritar porque senão judiavam da gente”.

A base de medicamentos para induzir o parto e sem forças para empurrar, M.B. ouviu da médica aos gritos, que era uma mulher “fraca e mole” e que “não estava ajudando”.

A profissional realizou na paciente a manobra de kristeller, quando quem realiza o parto sobe sobre a paciente para forçar o parto.

“Eles fizeram 8 pontos de pique e forçaram meu parto subindo em cima da minha barriga e deram um solavanco com as mãos juntas”.

A filha de M.B. também nasceu roxa e com a clavícula descolada. “Foi horrível. E naquele momento eles me culpavam dizendo que eu não ajudei fazer força e por isso minha filha tinha deslocado a clavícula”.

Bebê morto

Já R.J.A. relatou que perdeu o primeiro filho por conta da violência no parto. “Não tive a mesma sorte. Perdi meu bebê, meu primeiro filho. Sofri os mesmos insultos em um hospital municipal”.

“Tratam as pessoas como se fosse lixo! Lamentável. Mas um dia a conta chega pra eles”, afirmou.

Martinho alerta para a necessidade de implementação de um parto humanizado, que tem início desde o pré-natal, no qual a mulher passa também a ser objeto de preocupação dos profissionais.

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“O foco deles é a barriga, o útero e o nenê e esquecem-se de ver a mulher como um todo. O pré-natal humanizado começa vendo a mulher como um todo”, explicou.

“Ela é preparada para o parto natural, diminuindo a incidência de cesárea, de violência obstétrica. Tem uma série de fatores positivos que acontecem”.

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