Lygia Clark foi uma das artistas brasileiras mais importantes do século 20 no Brasil e no exterior. Para a crítica especializada de sua época e os atuais “experts” na área, Lygia pensava a arte “não como obra acabada, mas como estímulo à percepção, como proposta vivencial em busca da plenitude do ser, realizando-se no outro e através dele”, como definiu o crítico Sérgio Milliet.
Para Milliet, um dos intelectuais mais respeitados do país de todos os tempos, Lygia Clark fez obras inovadoras e dinâmicas, estimulando as criações interativas, numa época que essa palavra nem era usada com a frequência que se tem hoje.
Lygia faleceu em 25 de abril de 1988, aos 67 anos de idade. Em comemoração ao centenário de seu nascimento a Pinakotheke Cultural de São Paulo, em colaboração com a Associação Cultural Lygia Clark, abriu, na capital paulista, a exposição Lygia Clark (1920-1988) 100 anos. A mostra vai ficar aberta ao público até 15 de janeiro de 2022.
A exposição tem curadoria de Max Perlingeiro, diretor da Pinakotheke Cultural Rio de Janeiro e da Pinakotheke São Paulo. A mostra reúne aproximadamente 100 obras da artista, entre pinturas, desenhos, gravuras, bichos, trepantes (um modelo de estrutura destinado a construções de grande porte, que são desenvolvidas por fases de concretagem e onde a utilização de andaimes se mostra inviável), obra mole, casulo, objetos relacionais, fotografias e documentos. Segundo o curador, em sua quase totalidade são obras inéditas ao público brasileiro.
Uma delas é a coleção Bichos. Ela pertence ao espólio do crítico inglês Guy Brett, que morreu em fevereiro de 2021, aos 78 anos de idade. Ele foi grande amigo de Lygia Clark, desde que se conheceram, na mostra individual da artista brasileira, na Signals Gallery, em Londres, em 1965.
Inéditas
Outras obras inéditas em São Paulo são as chamadas obras formais, datadas de 1943 a 1952, como a série Escadas” (1947). Também são inéditos os trabalhos Objetivos Relacionais, feitos entre 1968 e 1973. Eles foram reunidos na mesma exposição paulista. Para pessoas que conhecem a trajetória da artista, trata-se de seu experimento mais “radical” em toda a sua trajetória. Perlingeiro informa que essas obras nunca foram vistas pelo público, como as séries Superfície Modulada e Espaço Modulado também disponível na Pinakotheke.
Segundo o curador, essa exposição pode ser considerada histórica, pelo ineditismo dos trabalhos e por propor ao público um mergulho no desenvolvimento do pensamento desta, que é considerada uma das mais importantes artistas do século passado, que já ganhou exposições em museus de prestígio como o MoMA de Nova York, e o Museu Guggenheim de Bilbao, Espanha, entre muitas outras instituições.
Perlingeiro afirma que a mostra obedece a uma cronologia, dividida em 17 ordens conceituais que compõem a sua trajetória de artista: Escadas (1947), Kleemania (1952), Quebra da Moldura (1954), Linha Orgânica (1954), Arte/Arquitetura (1955), Superfície modulada (1955-1956), Planos em superfície modulada Série A (1957), Planos em superfície modulada Série B (1958), Espaço modulado (1958), Unidade (1958), Ovo linear (1958), Contra relevo (1959), Casulo (1959), Bicho (1960-1964), Obra mole (1964), Trepante (1965) e Objetos relacionais (1968-1973).
O público poderá seguir textos de parede escritos pelo crítico Paulo Herkenhoff, que auxiliam a compreensão e a evolução do pensamento da artista e suas criações. Segundo o curador, a exposição traz ainda outras preciosidades, como a recriação, a partir de uma fotografia, da montagem de 7 Unidades, na Mostra Neoconcreta, de 1958, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, onde ela aparece sentada na cadeira desenhada por Abraham Palatnik.
O crítico é considerado um dos pioneiros da chamada arte cinética no Brasil, que se relaciona com ciência e tecnologia. Nesse trabalho de Lygia, as obras e a cadeira estão exatamente na mesma posição da fotografia, que pode ser vista na exposição e no livro que a acompanha.
Animação
A Pinakotheke Cultural de São Paulo traz, ainda, uma animação do ensaio fotográfico feito por Alécio de Andrade (1938-2003) da performance Arquiteturas biológicas II, que Lygia Clark criou em 1969 no Hôtel d’Aumont, em Paris. A animação foi feita por Fabrício Marques, e o realejo é de Gabriel Pinheiro.
Em dias alternados, o público poderá ver na exposição os filmes Memória do corpo (1984), de Mário Carneiro, 30’, com produção de Solange Padilha e videografia de Waltercio Caldas, que registrou a última proposta desenhada pela artista, a Estruturação do Self; e O mundo de Lygia Clark (1973), de Eduardo Clark, com direção de fotografia de David Drew Zingg e Antonio Guerreiro, e música de Naná Vasconcelos.
Uma sala especial foi montada para exibir a videoinstalação DSÍ – embodyment (2021), 8’, três câmeras com três diferentes monitores, com registro da performance de Carolyna Aguiar, e direção de Leticia Monte e Ana Vitória. Nessa videoinstalação, o espectador é convidado a viver a experiência dos estados inaugurais do corpo fragmentário em sua perspectiva pulsante de vida e morte. “Aqui o corpo debate-se em constante luta de vir a ser o que se é, desventrando-se e recolhendo-se continuamente em uma incessante dança-luta imemorial, lugar dos vazios-plenos, que Lygia Clark insiste que revisitemos.”
Quem visitar a exposição, pode obter um livro bilíngue – em português e inglês – também sob o titulo Lygia Clark (1920-1988) 100 anos. O livro tem 316 páginas e traz textos críticos inéditos, imagens e informações sobre as obras, uma seleção da correspondência pessoal entre Lygia e amigos artistas e intelectuais, e uma cronologia resumida atualizada.
Biografia
Lygia Clark nasceu Lygia Pimentel Lins. Ela era mineira de Belo Horizonte. Morreu no Rio de Janeiro em 1988, aos 67 anos de idade. O sobrenome Clark ela adotou do companheiro Aluísio Clark Ribeiro, com quem teve três filhos. Ao longo de sua trajetória, se propôs a explicar a arte para o espectador e desmistificar o que fazia. Ela desenvolveu todo o seu talento natural ao lado de intelectuais importantes como Burle Marx, o pintor cubista francês Jules-Fernand-Henri Léger, o pintor, ilustrador, desenhista e gravurista Árpád Szenes, húngaro-francês, e o brasileiro Ivan Ferreira Serpa.
Entre 1970 e 1976. Lygia viveu em Paris, onde lecionou na Faculdade de Artes Plásticas St. Charles, na Universidade de Sorbonne. Quando retornou ao Brasil, em 1976, Lygia Clark começou a estudar a arte como possibilidade terapêutica. Foi quando passou a falar em arte sensorial, muito próxima à psicanálise. Na década de 1980, sua obra obtém reconhecimento internacional e são realizadas várias exposições em diversas capitais do mundo.
Serviço
Lygia Clark (1920-1988) 100 anos
Local: Pinakotheke São Paulo
Rua Nelson Hungria, 200 – Real Parque – Morumbi
Até 15 de janeiro de 2022
De segunda a sexta-feira – das 10h às 19h
Sábados – das 10h às-16 horas
Edição: Maria Claudia