O deputado estadual Romoaldo Júnior (MDB) virou réu numa ação por improbidade ajuizada pelo Ministério Público Estadual (MPE) há quase três anos por causa da contratação de uma servidora fantasma para “atuar” em seu gabinete na Assembleia Legislativa, entre abril de 2011 a dezembro de 2012. A denúncia foi recebida pela juíza Célia Regina Vidotti, da Vara Especializada em Ação Civil Pública e Ação Popular.
Desde dezembro de 2018, o parlamentar está com as contas bloqueadas até o valor de R$ 236,2 mil, valor do prejuízo aos cofres públicos. A ex-servidora fantasma, Gislene Santos Oliveira de Abreu, e Francisvaldo Mendes Pacheco, que na época dos fatos era chefe de gabinete de Romoaldo, também viraram réus na ação por improbidade juntamente com o parlamentar emedebista, que no pleito de 2018 só conseguiu ficar como suplente de deputado.
No entanto, ele tem conseguido se manter na Assembleia Legislativa em sistema de rodízio, ocupando cadeiras de outros titulares que saem de licença e ele assume. “No caso vertente, ficou suficientemente demonstrada a probabilidade do direito, uma vez que a requerida Gislene ocupou cargo público na Assembleia Legislativa de Mato Grosso, percebendo remuneração regular sem a devida contraprestação, com a conivência e colaboração dos requeridos Romoaldo Junior e Francisvaldo Pacheco, resultando em prejuízo ao erário”, escreveu Vidotti na decisão liminar que bloqueou as contas dos três denunciados em dezembro de 2018.
Gislene é esposa do ex-secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh) e ex-deputado estadual Hermes de Abreu. Segundo o Ministério Público, desde 2006 Gislene passou a maior parte do tempo morando no Rio de Janeiro.
Ela é servidora efetiva da Secretaria de Estado de Segurança Pública e recebe hoje um salário de R$ 18,8 mil no cargo de analista de desenvolvimento social. Em 2011, foi requisitada pelo deputado Romoaldo Júnior para que pudesse exercer o cargo em comissão na condição de assessora parlamentar.
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Na peça acusatória, o MPE informou que, ao requisitar a ficha funcional na Secretaria de Estado, onde ela tem o cargo efetivo, verificou-se que Gislene obteve sucessivos afastamentos, durante todo o período de julho de 2007 a novembro de 2010. A única exceção foi no período de janeiro a março de 2011, quando ela voltou a trabalhar.
Hermes de Abreu, marido da servidora que foi “fantasma” na Assembleia Legislativa, desde a década de 90 encerrou suas atividades na vida pública e foi morar no Rio de Janeiro. “E essa é razão dos sucessivos afastamentos de Gislene, pois ficava constantemente naquela cidade, tendo, inclusive, realizado lá seu mestrado e seu doutorado, na Universidade Cândido Mendes”, afirmou o MPE em trecho da denúncia, ao acrescentar que “obviamente, Gislene não poderia simplesmente se ausentar de suas funções, razão pela qual contou com a conivência e auxílio do deputado Romoaldo Aloísio Boraczynski Júnior e do então chefe de gabinete Francisvaldo Mendes Pacheco [também parte no processo], que anuíram às suas ausências sem qualquer restrição ou justificativa, atestando falsamente que ela teria cumprido sua carga horária corretamente”.
O MPE pede a condenação dos três réus por improbidade para ressarcimento do erário e pagamento de multa civil. A servidora apresentou defesa nos autos e negou ter sido “fantasma” na Assembleia.
Ela sustentou não existir nenhuma conduta ímproba de sua parte e muito menos dano ao erário a ser ressarcido. Gislene confirmou que é servidora de carreira lotada na Sejudh desde 1995 e que em 2007 “tirou licença para qualificação técnica e profissional no Rio de Janeiro, para onde se mudou e levou sua família, retornando ao Estado de Mato Grosso em fevereiro de 2017, de forma definitiva”.
DEFESAS
Gislene de Abreu afirmou que todos os afastamentos, férias e licenças que lhe foram concedidas estão em conformidade com a lei, sendo que somente não requereu a licença remunerada “entre 2011 e 2012, por convocação do deputado Romoaldo Júnior, oportunidade em que atendeu a suplica do parlamentar e foi cedida à Casa de Leis, sobretudo porque Romoaldo pretendia que a profissional o auxiliasse em algumas demandas”. Ressaltou ainda que durante todo o período em que esteve cedida para a Assembleia, prestou serviços de forma regular e satisfatória, tanto presencialmente quanto à distancia, bem como durante toda a sua vida funcional sempre foi exemplar em suas funções.
Romoaldo Júnior alegou que a Vara Especializada de Ação Civil Pública não teria competência para julgar o processo. Também sustentou que “a petição inicial não individualiza qual seria a conduta que teria praticado, que caracterizaria ato de improbidade administrativa, trazendo apenas acusações genéricas, o que compromete o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa”. Por sua vez, a juíza Célia Vidotti pontou que o trabalho desenvolvido à distancia, de forma remota, é uma realidade bastante recente, aos quais os órgãos públicos aderiram tão somente com o surgimento da pandemia do coronavírus, no início de 2020, enquanto os fatos apurados na ação ocorreram no período entre 2011 e 2012.
“Assim, a alegação do exercício do labor à distancia, sem qualquer comprovação material da sua efetiva ocorrência, não é suficiente para a rejeição da inicial, conforme pretendem os requeridos Gislene de Abreu e Romoaldo Junior. Destarte, os fatos narrados na inicial e corroborados pelos documentos que a instrui, configuram, em tese, o enriquecimento ilícito, dano ao erário e ofensa aos princípios administrativos, ato também qualificado como improbidade administrativa”, contrapôs a magistrada no despacho do dia 25 deste mês.
Dessa forma, conforme ponderado pela juíza, a instrução processual será momento adequado para a comprovação e posterior análise acerca da existência e autoria ou não, dos atos de improbidade administrativa atribuídos aos requeridos. “Diante do exposto, ausentes as hipóteses de rejeição da inicial, recebo a petição inicial em todos os seus termos e para todos os efeitos legais. Citem-se os requeridos para, querendo e no prazo legal, apresentarem contestações”, diz trecho da decisão.