A depressão, suas causas e a eficácia dos tratamentos disponíveis hoje são alvos de diversos estudos científicos, que buscam compreender melhor a atuação da doença no corpo humano e as formas de combatê-la.
O interesse pelo tema não é à toa, segundo a última Pesquisa Vigitel, realizada pelo Ministério da Saúde, cerca de 11% da população brasileira sofre com um quadro.
Porém, recentemente, uma revisão de pesquisas indicou que a falta de serotonina no cérebro – situação que era atribuída ao desenvolvimento do problema – não pode ser confirmada como a causa da depressão, levando diversos pacientes a questionarem se os antidepressivos de fato funcionam para o diagnóstico.
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Agora, um novo estudo, publicado na revista científica British Medical Journal (BMJ) reforçou que sim, os medicamentos funcionam, porém não para todos de forma significativa.
Conduzido por pesquisadores da Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos Estados Unidos; da Universidade John Hopkins; da Clínica Cleveland e da Universidade de Harvard, o trabalho analisou 232 estudos com dados de 73.338 participantes, que foram conduzidos entre 1979 e 2016. A constatação foi que apenas para 15% foram observados benefícios consideráveis dos medicamentos a longo prazo.
Para avaliar essa resposta aos remédios, os estudos utilizaram um índice chamado de escala de Hamilton. Ele é obtido por meio de uma avaliação com 17 itens que atribui ao paciente uma pontuação de 0 a 56 pontos, em que quanto maior, mais grave o quadro de depressão.
Após a análise, os pesquisadores concluíram que, no geral, o tratamento com os antidepressivos impactou em média apenas em 1.8 os pontos na escala, em comparação com o placebo, um efeito comprovado, porém pequeno.
Isso porque, enquanto a terapia com os medicamentos levou a uma redução de aproximadamente 9.8 pontos na escala, aqueles que receberam placebo tiveram uma pontuação em 8 unidades menor – logo, apenas 1.8 pontos foram de fato atribuídos aos remédios.
Para os pesquisadores, um efeito em “larga escala” do remédio, que seria observado em diminuições a partir de 16 pontos, foi limitado nos estudos.
Apenas 24,5% dos participantes que tomavam medicamentos relataram a queda em “larga escala”, e 9,6% no grupo placebo.
Comparando os dois casos, os números indicam que apenas 15% dos pacientes de fato atingiram a redução considerada significativa por meio dos antidepressivos.
“(Os resultados) sugerem que cerca de 15% dos participantes têm um efeito antidepressivo substancial além de um efeito placebo em ensaios clínicos (…) Mais pesquisas são necessárias para identificar o subconjunto de pacientes que provavelmente necessitarão de antidepressivos para uma melhora substancial (…) Dada a modesta probabilidade absoluta de benefício substancial em relação ao placebo, e quando consistente com a disponibilidade e as preferências do paciente, pode ser preferível começar com tratamentos de baixo risco para depressão aguda leve a moderada”, sugeriram os responsáveis pelo estudo.
A conclusão não surpreende, uma vez que os medicamentos atuam elevando neurotransmissores como a serotonina no cérebro. No entanto, uma ampla revisão de cientistas britânicos publicada no periódico Molecular Psychiatry neste ano afirmou que “as principais áreas de pesquisa da serotonina não fornecem evidências consistentes de haver uma associação entre serotonina e depressão, e nenhum suporte para a hipótese de que a depressão é causada pela atividade ou concentrações reduzidas de serotonina”.
A publicação do trabalho levantou um debate sobre a real eficácia dos antidepressivos. No entanto, pesquisadores explicam que já se sabia que a depressão tem uma série de causas, e que não pode ser atribuída exclusivamente à falta de serotonina.
Em artigo publicado no The Conversation, o professor de Psiquiatria Biológica da Universidade de Edimburgo, Andrew M McIntosh, e a professora de Epidemiologia e Estatística Genética do King’s College de Londres, Cathryn Lewis, ambos no Reino Unido, explicam o que se sabe sobre o diagnóstico.
“As raízes da depressão são variadas e as pessoas podem ter razões muito diferentes para seus sintomas. O trauma psicológico é um fator de risco bem estabelecido. E a inflamação é cada vez mais reconhecida como uma causa provável em muitos estudos de pesquisa. Muitos fatores genéticos também foram identificados, cada um com um efeito muito pequeno. Existem provavelmente milhares de pequenos efeitos genéticos com cada pessoa tendo uma combinação quase única que pode aumentar o risco de depressão”, escreveram os especialistas.
Eles destacam ainda que as evidências que desassociam a depressão à ausência de concentrações adequadas de serotonina não excluem os benefícios que têm sido observados em diversos estudos pelos antidepressivos.
“Ensaios controlados randomizados de milhares de pessoas deprimidas mostraram, sem sombra de dúvida, que os medicamentos antidepressivos são eficazes na depressão (…) Insinuar que os antidepressivos podem não valer a pena é interpretar mal uma base de evidências que diz exatamente o contrário. Constantemente, estamos começando a entender mais sobre as causas da depressão e identificar subtipos, ou ‘depressões’, que possuem mecanismos e tratamentos mais específicos. Nossa compreensão da depressão e seu tratamento vem avançando há mais de um século e não mostra sinais de desaceleração. Identificar as causas e novos tratamentos para a depressão é difícil, mas essencial se quisermos abordar uma das causas mais comuns de incapacidade em todo o mundo”, defendem os autores.
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Fonte: IG SAÚDE