“As expectativas sobre comportamento feminino adequado, criadas ao longo desses séculos todos, têm autorizado muitas vezes uma absurda responsabilização de meninas mulheres pela própria violência que sofreram”, afirmou a promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo Silvia Chakian de Toledo Santos, no encerramento do Seminário Diálogos sobre a Violência Doméstica. Com exposições voltadas para o tema “Direitos fundamentais com perspectiva de gênero”, o evento virtual terminou nesta quinta-feira (4). Cerca de 300 pessoas acompanharam os três dias de palestras, debates e reflexões pela plataforma Microsoft Teams e pelo YouTube.
“Quantas gerações de mulheres serão sacrificadas até que uma vítima possa recorrer aos seus direitos sem ser julgada pelo seu comportamento social, sexual, e sem sofrer dano emocional? Precisamos fazer uma discussão mais séria sobre consentimento, pensar uma reforma do nosso Diploma relacionada à legislação sexual, pensar que a proteção eficiente não vai ser possível sem que a aplicação das leis seja acompanhada pela perspectiva de gênero”, acrescentou a palestrante. Silvia Chakian lembrou também a necessidade de mudar a postura da sociedade como um todo, uma vez que impera uma dupla moral para homens e mulheres, que faz com que certas coisas sejam aceitáveis para eles e condenáveis para elas.
A promotora abordou o que é e qual a importância da perspectiva de gênero; a persistência dos estereótipos de gênero que influenciam negativamente a atuação das instituições que integram o Sistema de Justiça e prejudicam a proteção dos direitos fundamentais de meninas e mulheres; e a necessidade dessas instituições adotarem novas lógicas e políticas que permitam romper com as resistências do patriarcado, para que se tenha uma defesa dos direitos fundamentais de forma eficiente e com a devida perspectiva de gênero.
“Outro dia um colega dizia para mim: mas vocês veem gênero em tudo? A resposta é sim”, iniciou. Para a palestrante, até quando se fala da piora das condições do planeta, da poluição ou da falta de saneamento básico, o impacto é sempre mais negativo para grupos vulneráveis, dentro os quais estão as meninas e mulheres, e seus filhos. “Especialmente as mais pobres, do campo, das florestas, ribeirinhas, indígenas, dependentes das economias de subsistência, que são mais devastadas com as mudanças climáticas, com a seca, com a escassez de recursos naturais, com a falta de água, de esgoto tratado, quando então essas mulheres e meninas passam a estar mais próximas da miséria e mais distantes da emancipação”, consignou.
Silvia Chakian então enfatizou: “Para esse colega e para todos os que não aguentam mais falar de gênero, vou dizer que nunca foi tão importante falar da proteção dos direitos fundamentais com a perspectiva de gênero e a sua intersecção com os marcadores sociais de raça e classe, por exemplo”. Segundo a promotora de Justiça, todo o contexto atual de instabilidade política, crise econômica, agravamento da fome, da pobreza, do desemprego e da violência afetam principalmente as mulheres e não há como dissociar isso da questão de gênero. “A pandemia, que devastou o mundo, trouxe milhares de mortes, que deixa um legado de crise política econômica de saúde sem precedentes, também escancarou as desigualdades e as vulnerabilidades especialmente para meninas e mulheres”, concluiu.
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O painel desta quinta-feira teve como debatedora a promotora de Justiça Lindinalva Correia Rodrigues, e como presidente de mesa a promotora de Justiça Elisamara Sigles Vodonós Portela.
Trilha sonora – No decorrer do evento, foram executadas as músicas do álbum “Meu Corpo, Minha Voz, Meu Direito”, lançado em 2019 como resultado da I Mostra Estudantil de Música realizada pela Rede de Enfrentamento à Violência Doméstica Contra a Mulher de Barra do Garças e Pontal do Araguaia – Rede de Frente. O CD contém a música tema do projeto e as dezesseis produções musicais dos alunos participantes, ouça aqui (https://soundcloud.com/mpmt/sets/i-mostra-de-estudantil-de-musica-meu-corpo-minha-voz-meu-direito). O objetivo da iniciativa foi fomentar dentro dos ambientes escolares a discussão e a reflexão sobre a violência contra as mulheres, crianças e adolescentes.
O evento – O Seminário Diálogos sobre a Violência Doméstica foi realizado de 2 a 4 de agosto, em conjunto pelo Centro de Apoio Operacional (CAO) Estudos de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Gênero Feminino e Escola Institucional do Ministério Público do Estado de Mato Grosso. O evento virtual, que foi transmitido ao vivo pelo canal do MPMT no YouTube, atende à Recomendação n° 89/2022 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
Fonte: MP MT