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Sem poder abraçar os filhos, reeducandas mantêm contato por vídeos e cartas

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A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) provocou mudanças na rotina e nas restrições de convívio social. Muitos se queixam da falta de lazer e do contato físico com familiares. Mas para Aline, que já é privada de liberdade, a angústia é ainda maior, principalmente com a proximidade do Dia das Mães (10.05). Cumprindo pena na Cadeia Pública de Nortelândia (250 km ao Centro-Sul de Cuiabá), ela havia acabado de retomar o contato com a filha, de seis anos de idade, depois de enfrentar a resistência do pai e familiares dele.

Ela foi mãe aos 16 anos de idade e presa aos 18, por isso a convivência foi mínima. Hoje, com 23, completou quatro anos na unidade e ainda cumprirá cerca de 10 anos de pena. A menina fica com os avós paternos, em Tabaporã (643 km ao Norte da capital), e por conta de um acidente, teve edema cerebral e necessita de cuidados especiais.

“Ela ficou com algumas sequelas, tem dificuldade na fala e para andar. Eu consegui retomar a comunicação com eles e obter notícias dela recentemente, estava reconstruindo nossa relação”, conta.

Como o município é distante, estavam programando a visita da filha, quando os planos foram suspensos, justamente em função das medidas de prevenção ao coronavírus. Para tentar amenizar a situação, a unidade tem propiciado o contato por cartas, ligações e e-mails. “Não ter participado da vida da minha filha é algo que me pesa muito, sempre digo que a cadeia não é o que dói mais, mas a falta da família, a saudade é o que mais machuca”.

Aline diz que receber uma carta é transformador. “Eu fico triste porque esse vírus aconteceu bem na hora que estava reconstruindo o alicerce familiar, mas pelo menos temos essa opção. Saber que alguém parou um instante para escrever, que se preocupa e lembra de você, é o que me dá forças”.

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A jovem frisa que a maternidade, mesmo para quem comete erros, é algo sublime. “É uma dádiva que Deus deu e, independente de sermos mulheres presas, todas nós temos um sentimento, um coração, mas não deixamos de ser mães e mulheres”.

É o primeiro Dia das Mães que Daniela vai passar reclusa. Cumprindo pena há 10 meses na Cadeia Pública de Nortelândia, ela mantém contato frequente com os quatro filhos, de 15, 13, 10 e seis anos de idade.

“Sinto muita saudade, falo com eles por telefone atualmente. Antes, eles não falhavam nenhum sábado de visita, agora vai fazer muita falta”. Para ela, que tem 37 anos de idade, os telefonemas e as cartas são formas de diminuir um pouco a tristeza. “É diferente de abraçar e beijar, mas pelo menos conseguimos saber como eles estão. Espero que isso passe logo”.

As unidades penais tiveram que ajustar a programação de comemoração do Dia das Mães, também em função das medidas de prevenção ao coronavírus. Segundo a diretora da Cadeia Pública de Nortelândia, Adriana Silva Duarte Quinteiro, a unidade preparou atividades internas com intuito de amenizar a ausência dos filhos e a ansiedade das mulheres.

“Para as 54 reeducandas que são mães (do total de 61), iremos proporcionar uma tarde de cine pipoca, no sábado, e depois do filme iremos apresentar no telão as fotos dos filhos. No domingo teremos um almoço especial para elas e também receberão a visita virtual dos familiares”.

As policiais penais plantonistas que são mães também serão contempladas com uma surpresa, realizada em parceria com o Conselho da Comunidade de Nortelândia.

Amor incondicional

No Norte do Estado, o amor incondicional ao filho levou Fabiana* à Cadeia Feminina de Colíder (650 km de Cuiabá). Ela, que completou 40 anos de idade este ano, está reclusa há seis meses.

“Estou sendo culpada por ser mãe de um filho que o tráfico recrutou para o serviço deles, pois poderiam até matá-lo se eu apontasse os verdadeiros culpados”. Acusada de envolver o filho mais velho (ela tem mais quatro filhos) no tráfico de drogas, ela afirma que não assumiu o crime, mas que teme pela vida do jovem e, por isso, foi presa.   

“Não posso ver meu filho morrer na mão dessas pessoas, não conheço ninguém do tráfico, sou trabalhadora, crio meus cinco filhos sozinha. Eu levantava muito cedo para trabalhar, e meu filho mais velho foi recrutado para fazer isso, mas ele é um menino bom, por isso eu estou pagando o preço por ele, porque eu conheço o filho que eu tenho”, diz, em lágrimas.

Fabiana* espera que, quando sair da unidade, consiga retomar a vida e afastar o jovem de pessoas ligadas ao tráfico. Antes de ser presa, ela sustentava sozinha os cinco filhos com uma renda mensal de R$ 400. 

“O pai é alcoólatra e não liga muito para eles, então fico preocupada de estarem lá fora, vulneráveis. Eu não tenho bens, nem carro, nem moto, como podem achar que faço parte do tráfico? “.

As visitas presenciais amenizavam a saudade, mas, de acordo com ela, também são momentos difíceis. “Quando o mais novo, de cinco anos, veio me ver ele já começou a chorar quando estava entrando na unidade, é muito doloroso”.

Como uma singela homenagem, as 50 mães que cumprem pena na Cadeia Feminina de Colíder terão um chá da tarde e sorteio de produtos. A unidade também promoverá café da manhã para as servidoras. A diretora, Eli Terezinha de Ávila, explica que são feitas vídeo-chamadas e que apenas sete do total de 57 reeducandas não são mães.

“É uma situação difícil para elas, então queremos proporcionar, dentro do possível, as melhores condições nesse Dia das Mães e nos demais também”.

Linhas cheias de saudade

Em Cáceres (214 km a Oeste de Cuiabá), a saudade também vai marcar o dia de 27 reeducandas que são mães, do total de 35 mulheres que estão na unidade.

Ana* tem 46 anos de idade e está na Cadeia Feminina da cidade há um ano e sete meses. Os três filhos, já adultos, moram em Primavera do Leste (240 km da capital), com os quais ela tem mantido contato por cartas.

Segundo ela, a única coisa que ameniza a saudade é continuar se comunicando para ter notícias da família.

“É triste porque não estarei perto deles, minha mãe já é bem de idade e minhas meninas cuidam dela, pois está com problemas de saúde. O menino já é casado e mora com a família dele. Mas pelo menos sei que estão bem e consigo falar por cartas”.

A diretora da unidade, Franciskely Campos Moreira, afirma que estão conversando constantemente com as recuperandas, a fim de explicar a situação. “Falamos sobre as medidas externas que são tomadas em prevenção ao coronavírus e que refletem no cotidiano delas, para tentar diminuir a ansiedade”.

A programação de Dia das Mães inclui café da manhã especial, sessão de cinema, sorteio de brindes, entrega de uma lembrança e exibição de vídeos com fotos enviadas pelas famílias. Já as servidoras serão contempladas com a entrega de uma lembrança também.

A Penitenciária Feminina Ana Maria do Couto May, em Cuiabá, também preparou sessões de cinema para as reeducandas, e um almoço em homenagem às servidoras mães. Para Carla*, que está na unidade há três anos, a falta das visitas dos três filhos e do trabalho extramuros só aumenta. “Vai ser o primeiro Dia das Mães sem a presença da família. Pedimos a Deus que esse período da pandemia passe logo. Nós que trabalhamos fora sentimos muita falta do contato com as pessoas, e ficamos preocupadas em como nossos filhos estão, a saudade é muito grande”, define ela, que tem 32 anos de idade.

A unidade de Cuiabá possui 187 recuperandas, das quais 185 são mães.

*Os nomes foram preservados para resguardar a identidade das entrevistas.

Fonte: GOV MT

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